💌 Dos hábitos perdidos, este é um dos que mais sinto saudades. Quando eu era criança, como quase todas as minhas amigas, colecionei papéis de carta. Talvez, para as pessoas mais jovens que lêem #UmTetoTodoMeu, objetos nunca vistos…Para ser sincera, eu não via muito sentido em guardar aquelas folhas ilustradas com flores, borboletas, bichinhos e Hello Kitty (uma cinquentona, aliás). Eu usava para escrever cartas. Por um tempo, mantive correspondência com a minha avó Celinha, que morava na mesma cidade que eu, inclusive.
O mundo era outro. Telefonar era caro e apenas para urgências. Por mais que eu passasse longos períodos na casa dela, combinamos de nos escrever para contar alguma coisa curiosa que nos havia acontecido naquele dia, naquela semana. Não havia as redes sociais. Então, os nossos “stories” eram as letrinhas cursivas. Como minha avó não tinha papel de carta, costumava ilustrar as folhas com estrelas que ela mesma desenhava.
Outro dia, li o belo Correspondência, de Bartolomeu Campos de Queirós, com ilustração de Lelis. Destinada ao público infantojuvenil, a proposta de Bartô (tive a honra de conhecê-lo) é uma verdadeira carta de amor em busca de um país melhor. Um grupo de amigos escolhe palavras do dicionário para que sejam amplamente usadas ou esquecidas.
Eu tenho uma caixa de cartas, cartões e bilhetes no fundo do meu armário, com linhas traçadas por muitos que já partiram, como minha avó, meu tio Marco, meu pai e minha amiga Marianinha. Sempre que abro, me emociono. Costumo manuseá-la nas tais limpezas anuais e mudanças. Talvez a prática chinesa milenar do Feng Shui não recomende que eu guarde correspondências, mas elas são muito mais do que isso.
💌 Livros de cartas
Houve um tempo em que escritores trocavam cartas com amigos, familiares, amores e mestres. Eu tenho na estante alguns livros do gênero que estão entre meus favoritos. Há o risco imenso de esquecer algum, no entanto, esta é a minha lista para levar para uma ilha deserta.
Cartas perto do Coração. O livro foi organizado por Fernando Sabino e traz sua troca de correspondência com Clarice Lispector entre os anos 1946 e 1969.
Carta a D. História de Um Amor. Um pequeno e precioso livro. André Gorz escreveu para homenagear Dorine, com quem viveu por quase sessenta anos. A esposa tinha uma doença degenerativa.
Cartas: Caio Fernando Abreu. Um compilado de correspondências que o jornalista e escritor gaúcho trocou com nomes como Maria Adelaide Amaral, Hilda Hilst, João Silvério Trevisan, entre outros. Está há um tempo esgotado, mas vale a busca.
Cartas a Um Jovem Poeta. Um clássico. No fim de 1902, Franz Kappus decide escrever para Rainer Maria Rilke, uma referência para ele. A partir da resposta do poeta, o leitor se encanta com a troca que reflete sobre a literatura, a arte e a vida.
Com o mar por meio - Uma amizade em cartas. José Saramago e Jorge Amado trocaram cartas, bilhetes e mensagens compartilhando ideias e questões tanto de suas vidas como da conjuntura contemporânea nos anos de 1990.
💌 Central do Brasil
Em 1998, Walter Salles lançou o emocionante Central do Brasil (filme que levou Fernanda Montenegro a concorrer ao Oscar - e perder para Gwyneth Paltrow). Na trama, Dora ganha a vida escrevendo cartas para pessoas analfabetas, mas ela sequer enviava a maioria. É quando o destino coloca diante dessa ex-professora, Ana (Soia Lira) e Josué (Vinicius de Oliveira), com uma mensagem que precisa chegar ao remetente. Um filme que tem a correspondência como premissa de uma história emocionante.
É isso. Um abraço e até semana que vem.
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